A incerteza jurídica sobre a exigência de vacina dos empregados

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No dia 9 de fevereiro, o Supremo Tribunal Federal (STF) adiou o julgamento da constitucionalidade da Portaria nº 620/2021 do Ministério do Trabalho e Previdência, que proíbe a exigência do comprovante de vacinação para contratação de empregados e a dispensa por justa causa de empregados não vacinados. Ainda sem data prevista, apesar de referida portaria estar suspensa por determinação do STF, a incerteza e insegurança jurídica para os empregadores permanece.


Desde o ano passado, a portaria está com sua eficácia suspensa, em razão da cautelar concedida pelo ministro Luiz Roberto Barroso, que ao proferir a decisão defendeu direitos constitucionais dos empregadores, tais como o direito potestativo de extinção da relação de trabalho, bem como poder de direção, livre iniciativa, liberdade de estabelecer estratégias negociais e decidir sobre os critérios de contratação mais adequados.
Em apertada síntese, há expectativa que o plenário do STF se manifeste sobre os vícios formais postulados, uma vez que portarias editadas pelo Poder Executivo não podem criar obrigações, função típica do Poder Legislativo, e os preceitos constitucionais tidos como violados pela norma, tais como direito à saúde, à vida, e à dignidade da pessoa humana. Atualmente o placar está 4 a 0 pelo acolhimento das arguições de descumprimento de preceito fundamental da referida portaria.
No final de janeiro de 2021, por meio do Guia Técnico Interno sobre Vacinação[1], o Ministério Público do Trabalho (MPT) dispôs que, excetuadas situações excepcionais e plenamente justificadas, não há direito individual do trabalhador a se opor à vacinação e, no caso de recusa injustificada, observados os pressupostos expressos naquele guia, incluindo o direito ostensivo à informação, o empregador poderia aplicar, em último caso, a dispensa por justa causa do empregado.

Não é demais lembrar que a Consolidação das Leis do Trabalho, nos artigos 157 e 158, é expressa ao afirmar que cabe aos empregadores cumprir e fazer cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho e instruir os empregados quanto às precauções a tomar no sentido de evitar acidentes do trabalho ou doenças ocupacionais, o que, por si só, já justificaria classificar a vacinação contra a Covid-19 requisito compulsório.
Em entrevista ao Metrópoles[2], o procurador-geral do Trabalho José de Lima Ramos Pereira já se manifestou favoravelmente à vacinação compulsória, ao afirmar que “a vacinação é uma obrigação, tem que ser compulsória, porque tem que olhar o interesse público acima do interesse individual. Isso é uma exigência necessária do empregado”.
O Tribunal Regional do Trabalho em São Paulo proferiu a primeira decisão de segunda instância confirmando a possibilidade de dispensa por justa causa de empregada que se recusou a tomar vacina. Para os desembargadores que julgaram o caso, “não se mostra razoável aceitar que o interesse particular do empregado prevaleça sobre o interesse coletivo, pois, ao deixar de tomar a vacina, a empregada colocaria em risco a saúde dos seus colegas da empresa (…) e é dever do empregador oferecer aos seus empregados ambiente de trabalho salubre e seguro, nos termos da Lei (…)” (Processo nº 1000122-24.2021.5.02.0472).
A ex-presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), ministra Maria Cristina Peduzzi, por sua vez, em entrevista ao UOL Economia[3], afirmou que o bem-estar coletivo é mais importante que o direito individual de escolher tomar ou não a vacina: “O direito da coletividade se sobrepõe ao direito individual e, se um empregado se recusa à vacinação, ele vai comprometer o meio ambiente de trabalho que necessariamente deve ser promovido, por meio do empregador, da forma mais saudável possível, por isso que há uma justificativa que tem embasado decisões nesse sentido”, disse.
Em pesquisa divulgada em agosto do ano passado pelo Exame/Ideia, 67% dos brasileiros creem que os empregadores podem exigir a vacinação contra a Covid-19 dos funcionários[4].
Vale ressaltar que o STF já se manifestou sobre a constitucionalidade da vacinação compulsória (ADIs 6.586 e 6.587 e ARE 1.267.897), ao decidir que a União, os estados e os municípios podem atribuir caráter obrigatório à imunização e impor restrições para quem decidir não se vacinar.
A Lei nº 13.979/2020, por seu turno, é expressa no tocante à possibilidade da adoção da vacinação compulsória, não forçada, por meios indiretos de sanção, como restrição de certas atividades ou frequência a determinados lugares, por exemplo.
Seguindo o mesmo raciocínio, há expectativa de pronunciamento do STF no sentido de que vacinação obrigatória pode ser condição para os empregados retornarem ao trabalho presencial, autorizando os empregadores a imporem sanções aos que se negarem a tomar vacina, incluindo dispensa por justa causa, pois a Constituição Federal garante aos trabalhadores a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança (artigo 7º, inciso XXII).
Todavia, enquanto o tema não é enfrentado diretamente pelo STF, recomenda-se que as empresas criem regras e protocolos de segurança claros e expressos, focadas na promoção das diretrizes adotadas para conter o contágio, sem prejuízo da adoção de outras medidas, como a divulgação da necessidade de adesão ao sistema de imunização, para dar guarida à dispensa justa causa dos empregados na hipótese de recusa à vacina.

 

Fonte: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/incerteza-juridica-vacina-empregados-23022022